sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Aquela ilustre (des)conhecida

É uma vergonha, mas hoje, e só hoje, me dei conta de que convivo com uma pessoa na minha família há quase quinze anos e eu praticamente não sei nada dela. É alguém que, pelo posto que ocupa, é uma pessoa próxima, mas porque eu nunca procurei de fato estabelecer um relacionamento real com ela, é alguém que eu praticamente desconheço.
É alguém que chegou meio que de repente, e aos poucos foi aparecendo mais e mais. No começo, não sabia se estaria por muito tempo, mas ao contrário de muitas das minhas previsões durante os primeiros anos, ela continua por aqui firme e forte, e cada ano que passa, eu me dou conta do quanto a participação dela é importante na minha família, mesmo que isso simplesmente não apareça.
Essa ilustre (des)conhecida é esposa do meu pai há sei lá, uns quase quinze anos. Bom, não tudo isso, porque esse é o tempo de relacionamento deles, mas acho que eles estão casados já há uns treze anos... aliás, eu me lembro do aniversário da minha sobrinha no qual eu a vi pela primeira vez: meu pai chega, como quem não quer nada, e apresenta a todos a nova namorada. Na época, morávamos com ele (eu, minha filha e o pai dela), e a nossa relação era bem complicada. Na verdade, não sei quanto tempo depois, fomos morar em outro canto, que não era a casa dele, e claro, isso não nos aproximou da esposa do meu pai. Não que naquela época eu realmente me importasse de me relacionar com ninguém novo: eu não conseguia nem me relacionar bem comigo mesma, que dirá fazer novos contatos em família!
Bom, os anos foram passando, e eu nunca a compreendi: sempre achei estranho o fato dela não se aproximar de nós, de nunca tentar conversar mais de perto, ou de estabelecer um contato seu comigo ou com uma das minhas irmãs... mas nunca pensei no quanto permitimos isso a ela, ou no quanto (mesmo sem querer) acabamos fechando as portas para algo mais profundo com ela como indivíduo, alguém além do título de "esposa do papai". Aliás, eu sempre achei que a obrigação de procurar uma aproximação era dela, porque afinal de contas, ela era o "elemento estranho", porque chegou depois e veio fazer parte. Mas eu nunca tinha parado para pensar no quanto é díficil trilhar essa estrada, afinal, eu nunca estive em seu lugar. Pelo menos não até muito recentemente.
Já escrevi sobre isso por aqui, e porque agora tenho flertado com o seu título para a minha vida, de tempos em tempos me deparo com situações que eu já vivi, mas em outras posições, e que me pareciam extremamente desconfortáveis, mas mal sabia eu que, na verdade, nem eram tão difíceis assim... porque a filha do papai será sempre amada por ele, e não deixará de ser filha nunca, e essa relação é muito mais resolvida entre o genitor e o filho, mas quem vem para formar um novo casal sempre acaba sentindo o sabor que é simplesmente não ser parte do acordo original, não ser parte da configuração de fábrica, e não saber bem como se encaixar. E no fim das contas, às vezes, mesmo a muita criatividade e disposição não são suficientes para que uma aproximação real aconteça, a não ser que quem já "estava por aqui" abra portas, e permita que o novo entre e crie novos laços.
E hoje, navegando pelo facebook, olhando uma postagem dela que nada tem a ver com o assunto em questão, me surpreendeu pelo seu teor, e me fez ver que o que eu conheço é apenas uma casca, uma imagem que eu formei com as poucas horas de conversas rasas de festas de família, ou sobre alguns assuntos mais polêmicos discutidos quase nunca em reuniões familiares... percebi que nunca perguntei pra ela do que ela gosta, o que ela prefere, o que ela sonhou para ela, e como ela gostaria de ser recebida. Notei que eu mesma nunca fiz nada de muito significativo para tornar essa relação existente, e mesmo nas poucas investidas que ela fez, eu não abri tanto espaço. Nada pessoal, apenas ignorância minha mesmo, porque eu não me coloquei no seu lugar.
Talvez tudo isso esteja me passando pela cabeça e pelo coração no momento por causa do que tenho vivido (aliás, muito provavelmente por isso), mas independente do motivo, eu sei que daqui em diante, depende de mim tentar algo novo. Claro, se ela não quiser mais por qualquer motivo, é direito dela. Mas agora, olhando para essa (des)conhecida, me vem um sentimento que é uma curiosidade em conhecer a pessoa que ela é misturada com uma solidariedade de quem vê o homem que ela escolheu tendo atitudes de amor pelas filhas sem entender direito como lidar com tudo isso (bom, eu mesma estou aprendendo e acho que provavelmente ainda terei um loooongo caminho a percorrer). Espero que com o tempo possamos trocar mensagens, não sobre o meu pai, mas sobre nós, sobre os nossos planos como pessoas, sobre a família (porque afinal de contas, fazemos parte do mesmo grupo familiar), e sobre outras coisas que eventualmente possamos descobrir que tenhamos em comum. E se, de repente, nada disso acontecer, que eu tenha a certeza de que, mesmo tarde, eu fiz tudo o que era possível para que ela, mesmo com quinze anos de atraso, se sinta acolhida como eu gostaria e quero ser.

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