Ontem ouvindo a mensagem do pastor, ouvi também sobre uma história muito conhecida na Biblia: a história da mulher que foi pega em adultério. Claro que sendo uma história conhecida, a expectativa era de ouvir aquilo que, apesar de muito precioso, já não é novo: todo mundo quis condenar a mulher mas Jesus não a condenou e sugeriu que quem não pecava que atirasse a primeira pedra... E todo mundo foi embora, ficando só a moça e Jesus. E Ele diz a ela que a condenação não virá Dele também, e que ela deveria seguir a vida deixando o pecado para trás.
Apesar de ser uma linda história, contada assim ela não dá a dimensão real da cena e do contexto. Aliás, ontem ouvi coisas que eu jamais tinha considerado, porque nunca tinha parado para imaginar o que realmente aconteceu, e essas coisas me fizeram enxergar o cuidado de Cristo com aquela pecadora que representa cada um de nós.
Em primeiro lugar, por que será que ela se prestava àquele papel? As mulheres naquela época não podiam trabalhar e não tinham valor (não sendo nem contadas). Sendo assim, uma mulher que por qualquer motivo tivesse sido rejeitada pelo seu marido (e a Bíblia conta que na época o homem poderia renegar a esposa) não seria aceita por mais ninguém, porque os homens não se casariam com mulheres consideradas impuras. Qual seria então o destino de uma mulher assim? Mendicância, dependência do favor alheio ou prostituição. A culpa neste caso, no fim das contas, era de quem? Só da mulher?
Fora disso, ela não estava adulterando sozinha. Isso significa que tinha mais alguém ali com ela, que não foi revelado, que não foi exposto e que não teve seu pecado levado à público. Ou seja, aquela mulher, que mesmo que fizesse aquilo somente pelo prazer do pecado (o que é altamente improvável), foi considerada culpada sozinha de um ato que é cometido a dois. Significa então que a outra metade do pecado a abandonou.
Essa mulher então, uma possível prostituta (como o caso da mãe do pregador de ontem), que estava ali provavelmente para conseguir o seu sustento do unico modo que conseguiu (ruim, impuro, ilícito mas talvez o único), de repente é também vítima da hipocrisia de uma sociedade que simplesmente considerava a mulher uma posse, como um camelo ou um saco de arroz.
Dito isso, quando aquelas pessoas chegam ao local em que o adultério está acontecendo, ela é encontrada obviamente com seu parceiro no ato em si, e certamente não houve nenhum tipo de compaixão ou respeito, e provavelmente não foi permitido que ela se vestisse... Aliás, para expor a situação, provavelmente ela foi arrastada pelos cabelos nua pela cidade até chegar à sinagoga. Inclusive, cabe uma pausa aqui: aquele grupo de homens não estava preocupado com o pecado em si daquela mulher ou com a situação moral da vida na cidade. A Bíblia conta que eles queriam achar um jeito de fazer Jesus se contradizer. Ou seja, aquela mulher foi também vítima da raiva daqueles homens em relação à Jesus, coisa com a qual ela não tinha absolutamente nenhuma relação. Isso também nos faz acreditar que para aqueles homens a coisa mais importante era deixar o contexto o mais evidente possível, de modo que Jesus fosse pego em contradição, já que Ele não poderia como judeu negar a lei, mas por natureza, pregando o amor, seria complicadissimo sair-se daquela armadilha. Então eu imagino que eles fizeram o maior escândalo que conseguiram com o assunto, chamando a atenção da maior quantidade de pessoas, até chegar à frente de Jesus.
Quando eles chegam com a mulher, começam o pretenso inquérito, esperando de Jesus a posição de delegado e juiz. E Ele, ao ver a mulher, começa a escrever na areia e não olha para ela, abaixando a cabeça. Agora... Por que Jesus não a encarou? Seria porque ela é uma mulher? Pouco provável, já que Ele conversou com tantas outras olhando nos olhos... Seria porque essa mulher era pecadora? Improvável também porque a especialidade Dele era lidar exatamente com os indesejados da sociedade. Então.. Por que não encará-la?
Parando para pensar, eu creio que Jesus tenha ficado tão triste com a situação em que colocaram aquela mulher que Ele não quis que ela sentisse mais vergonha pela sua nudez, não só física mas emocional e social, afinal de contas, ela estava ali completamente sem defesas. Olhar para ela seria adicionar mais um par de olhos no desconforto de estar completamente descoberta para todos, abandonada à propria sorte, que no caso, de acordo com a lei, era ser apedrejada. Então.. Jesus simplesmente a respeita, não fala com ela sobre o que ocorreu ou não, não pergunta o que ela fazia ou não (ou seja, não perdeu tempo tentando tapar o sol com a peneira e nem ficou discutindo quem fez o que de errado ou certo)... Ele só a respeitou e teve empatia dela. E se dirige a quem de fato queria falar com Ele, aqueles homens enraivecidos e hipócritas, e lança o desafio que os coloca na mesma posição dela: quem nunca pecou que atire a primeira pedra. E com essa proposta, um a um começa a se constranger porque simplesmente eles não poderiam negar que eventualmente pecavam (até por isso existiam os rituais de sacrificio para a purificação dos pecados), e eles ficam sem resposta, afinal, se para eles servia o sacrificio para o perdão, para ela também serviria o mesmo. Era uma brecha na lei que deixava aqueles homens atônitos, mas ao mesmo tempo restituia àquela mulher a vida em sociedade.
Aliás, Jesus era Mestre nisso. Foi o que Ele fez com a mulher samaritana, com essa mulher do adultério, com a mulher do fluxo de sangue, com o gadareno e com tantos outros com quem Ele encontrou. Uma vez que a pessoa se encontrava com Jesus, fosse qual fosse a sua nudez, Ele a cobria com amor e com respeito pela pessoa. E jamais Ele negou um pecado que a pessoa tenha cometido. Ele não fingia que as pessoas eram puras, Ele só dava a elas a possibilidade de serem reinseridas na vida em sociedade, de modo que fosse possível à pessoa cumprir o que Ele mesmo definiu como substituição da antiga lei: o amor à Deus e ao próximo como a si mesmo.
Jesus nunca usa a nossa nudez para nós prejudicar. Ele jamais nos condena, embora reconheça o pecado que praticamos e repudia o ato em si, não com julgamento, mas com amor. Ele nos faz ver que somos muito mais amados e valiosos do que aquele ato que cometemos, e que não precisamos nos alimentar de restos, seja de que natureza for.
A nudez diante de Deus é certamente a melhor prática. A nudez nos permite tratar de modo eficiente aquilo que precisa ser resolvido para que possamos seguir adiante. Não serve que nos cubramos, porque em primeiro lugar isso nos impede de reconhecer o que nós precisamos abandonar. Ele sempre sabe de todas as coisas, mas a cobertura que colocamos nas nossas vidas, só atrapalha a nós mesmos, e nos coloca numa situação de aparente conforto que, na verdade, só nos atrapalha. Mas, ao contrário, quando Ele nos cobre, e a Sua cobertura é sempre em amor e Graça, somos limpos e protegidos, e definitivamente curados.
Por fim, pensando nas relações que desenvolvi e nos erros do passado meus e de outros, e me colocando no lugar dessa mulher, as pessoas que ganharam meu respeito e admiração foram aquelas que ao invés de me julgarem, me cobriram com amor; que ao invés de me encobrirem, se puseram à disposição pra me ajudar a vencer; que ao invés de me expor, me ajudaram a me vestir de Graça e alegria que são fruto da redenção ao Espírito Santo de Deus. Se até Deus cobriu a nudez de Adão e Eva que foi evidenciada depois do pecado, e se Jesus cobriu a vida daquela mulher pega em adultério, quem sou eu para expor o meu irmão?
segunda-feira, 7 de janeiro de 2019
A roupa e a nudez
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário