domingo, 1 de dezembro de 2019

Hoje eu chorei

Hoje eu chorei.
Hoje eu parei, no meio da tarde, e olhando toda a nossa movimentação em casa, comecei a ver os vazios que estão surgindo por causa das coisas que estão indo embora, deixando dinheiro para que possamos viajar e espaço a mais nas nossas malas, para que possamos levar apenas o que realmente importa para a nossa próxima estação. 
Hoje eu, vendo tudo isso, e sabendo que tudo está no seu devido lugar, mesmo assim chorei.
E confesso que não chorei pouco: as minhas lágrimas lavaram as minhas bochechas, porque elas não puderam ser contidas pelos meus olhos e minhas pálpebras, que tanto se esforçaram, mas precisaram mandá-las sair para não afogarem.
Hoje, ao ver a superação do meu companheiro, ao perceber que mais uma vez poucas coisas realmente importam, ao entender que sim, é possível superar os medos, os desconfortos e as dores para seguir para o próximo passo com leveza e determinação, eu chorei. 
Ver um homem que comprou a nossa máquina de lavar e a veio buscar com sua filha quase no fim da adolescência me lembrou das diversas mudanças de casa que eu fiz com meu pai, carregando coisas nos braços, leves e pesadas, através de elevadores e escadas, tirando e botando coisas em carros dos mais diversos tamanhos.
Confesso que depois que eles foram embora eu chorei. Chorei de saudade do meu pai, de gratidão por tantas boas histórias, por tantas vezes que vivemos coisas diferentes e engraçadas...
Ao ver meu companheiro de vida se desfazendo de suas baterias, sendo ele baterista de alma e profissão, e se livrando da dor de mudar para seguir em frente para uma vida melhor e mais plena, eu chorei. Pelo privilégio de ver aquela cena, pela dor de não podermos levar nem ao menos um daqueles instrumentos, pela alegria da nossa história seguir em frente cada dia melhor, pelo que virá ainda até que cheguemos do outro lado dessa jornada... Eu apenas chorei!
Lembrei-me da minha mãe, quando ela decidiu esvaziar com 68 anos o seu apartamento para no ano seguinte fazer uma mudança radical de vida e vir morar na Europa, em um país com outros costumes, outra língua, outra história... Lembrei-me da tristeza dela sentada no chão, olhando a casa vazia, ainda tendo que ser toda reformada para ser entregue ao proprietário depois de 15 anos de muito uso... Do olhar dela se despedindo do nosso cachorro, e da certeza que ela teve que, mesmo doando absolutamente tudo, ela teria o sustento necessário através de outros meios quando precisasse, porque mais valia abençoar aquelas pessoas do que receber algum valor financeiro por aqueles objetos que, no fim, eram apenas objetos.
Eu me lembrei dela e chorei... Por não ter entendido a sua dor naquele momento, por me lembrar de sua bravura, por não poder contar com o seu abraço que está do outro lado do oceano abraçando a minha filha, que agora precisa muito mais dela do que eu. Eu simplesmente chorei.
Depois de tudo isso, decidi fazer algo de produtivo e fui tomar banho, me arrumei, e separei algumas coisas já para dar e outras para a mudança. E isso me fez muito bem.
E agora, ao escrever tudo isso, eu choro. Não de dor, não de tristeza, não de luto ou de saudade. Choro de alívio. Afinal de contas, não preciso ser perfeita. Posso ter toda a convicção do mundo na minha mente, e toda a paz do universo no meu coração, mas ao mesmo tempo, posso me permitir um dia de sensibilidade e simplesmente chorar, seja para transbordar tudo o que precisa sair e que melhor que seja com a umidade das lágrimas do que com a secura de palavras mal colocadas por acidente.
Choro de alegria porque sei que essas pequenas coisas que se vão são apenas coisas, e o que for necessário será readquirido, provavelmente muito melhor do que o atual. Choro para regar as minhas certezas de que a próxima etapa é de profunda prosperidade, e que o momento atual é o fim de um processo de limpeza da terra, e de arado do solo, para que o que tem sido plantado tenha espaço livre e esteja desimpedido para crescer e florescer. 
Choro de satisfação por saber que ser mulher é ser satisfeita mesmo em meio às batalhas, porque eu posso só sentar e chorar, e quando tudo o que precisa ir embora for com as lágrimas que estão parando de cair, então sobra apenas a empatia, a consideração, a admiração, a sensação de gratidão, plenitude e privilégio por viver mais uma estação completamente guiada por Aquele que me amou primeiro.
E viva o choro! Sim, hoje eu definitivamente chorei... 

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