Ontem caiu o primeiro dente da menorzinha aqui em casa, e foi um marco para todo mundo.
Para o papai, foi excelente porque ele teve o privilégio de participar da queda do primeiro dente da filha menor, assim como ele pode também estar no dia em que a filha maior passou pela experiência. Para a irmã maior, foi uma festa, porque agora ela poderia compartilhar com a irmã menor tudo aquilo que ela descobriu, como por exemplo como comer através do buraquinho do dente, como colocar a lingua, como falar sem babar... para a menor, foi uma experiência diferente e divertida, e claro, as piadas agora foram temporariamente multiplicadas.
Mas para mim... bom, para mim foi no mínimo curioso: eu voltei no tempo e lembrei como era quando os dentes da minha própria filha caíam. Lembrei que os tenho guardados até hoje (imagina só que a caixinha está lá, guardadinha, na minha bolsa de lembranças), e eu lembrei como essa é uma experiência ao mesmo tempo estranha e divertida para cada um de nós, e é um primeiro sinal concreto de que estamos crescendo.
Na verdade, a criança não tem tanta noção assim, mas nós adultos sabemos que, daqui em diante, o tempo voa... e que depois do primeiro dente, é uma descoberta após a outra, um desafio vencido após o outro... e quando a gente for ver... eles estão saindo de casa para viver aquilo que eles sonharam para si mesmos.
Como "madrasta" (e está entre aspas porque tecnicamente o título é seu quando a mãe falece), eu vejo de uma outra perspectiva tudo aquilo que vivi com a minha filha, e principalmente, tudo o que não vivi com ela. E vejo muitas coisas da mãe das meninas que, sinceramente, acho que ela não vê. Até porque, na ocasião, eu não via.
Para se ter uma ideia, quando a minha filha tinha essa idade, a câmera digital ainda era caríssima e inacessível para quase toda a população. E fazer fotos para depois revelar ainda era uma coisa meio fora do orçamento, e pouca gente andava com a máquina fotográfica na mão para registrar o cotidiano. Portanto, eu mesma nunca fiz fotos do dia em que os dentes da minha menina caíram... mas hoje é diferente, e eu pude fazer um registro para que a mãe, assim que voltar de viagem, possa ver como estava e como ficou, imediatamente após a queda. Não me ocorreu fazer um vídeo, mas se tivesse pensado, teria feito também. É uma forma colaborativa de fazê-la participar. Eu não tive isso com a minha filha... por que não posso oferecer isso a ela?
Uma outra oportunidade que tenho é que agora sempre que posso, mando fotos das meninas para as avós. Eu, como avó que mora distante, fico muito contente porque sempre tem um ou dois "informantes" que me ajudam a ter fotos e vídeos da minha Pequena Plenitude (agora eu a chamo assim por causa de uma foto em que ela está realmente radiante) e isso me ajuda a ter alguma participação do cotidiano dela. Então, tendo a possibilidade de também fazer registros interessantes e mandar para as avós (uma no Brasil e outra na França), por que não fazê-lo? É só uma continuação da gentileza que recebo com constância.
Mas o mais interessante disso tudo é que eu pude explicar porque temos que trocar de dentes... e isso me trouxe uma visão muito mais clara sobre alguns processos que temos que encarar na nossa vida.
A mais nova perguntou se eu não achava estranho a gente ter que passar pelo processo de perder dentes para esperar nascer outros no lugar... por que então não nascermos e ficarmos com os mesmos dentes para sempre? E eu expliquei que os dentes tem o tamanho adequado para o tamanho da nossa boca e da nossa cabeça quando a gente nasce... mas que o corpo cresce (a cabeça idem) e portanto, os dentes (que não crescem) ficam pequenos em comparação ao que a boca passa a precisar... então, se a gente mantivesse os mesmos dentes, praticamente a gente teria vários buracos na boca e comer seria bem mais complicado, fora a parte de higienizar e tals... ela entendeu, a mais velha completou, e eu fiquei pensando no assunto.
Se a gente comparar o dente com uma experiência do passado, é fácil entender porque a gente não gosta muito de desapegar do que aconteceu: a gente já passou quando bebê pela dificuldade de nascer o dente (a gente não lembra mas sabe que coçou, doeu, teve gente que teve febre, diarréia, etc), e depois a gente se adaptou bem à realidade de ter dentinhos. E quando a gente menos espera, eles começam a se movimentar, a comida engancha, e o medo vem... e o dente cai, fica o buraco, sai sangue, as vezes incomoda, e por um período fica aquele vazio esquisito que, por mais que seja divertido sentir com a lingua, atrapalha pra se alimentar e pode trazer outros desafios (quem usou aparelho para os dentes sabe do que estou falando).
Então, a gente fica agarrado àquela experiência que a gente passou, porque afinal de contas, ela ainda estava funcionando... a gente tinha tanta certeza de que ela era suficiente... porque, afinal de contas, ela nos serviu até aqui. Mas agora, assim como os dentes de criança caem, e precisam nascer dentes maiores, com uma estrutura mais forte, e com raízes mais profundas, de modo que possam durar funcionando bem por décadas, certas experiências tem também certo prazo de validade.
Portanto, não é desprezar o passado (assim como eu, muita gente guarda mesmo os dentinhos que caíram como lembrança), mas é saber que ter que trocar é sinal de saúde, de crescimento e de que, por mais que seja desconfortável, está tudo no seu devido lugar.
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