sábado, 20 de outubro de 2018

O momento de cada coisa na canção

Ontem assistindo a uma banda na TV percebi uma coisa que é absolutamente óbvia mas que, às vezes, não consigo me lembrar: tudo dentro da música tem o seu momento. Isso significa que cada uma das partes, cada um dos instrumentos, precisa entender em que momento participar, por quanto tempo cada intervenção, em que ritmo, em que intensidade, com que volume... senão, definitivamente não tem como o ouvinte receber uma mensagem coerente e marcante.
Notando ontem o povo da banda cantar, e a canção que começava tranquila e, conforme ia sendo executada, o público ia reagindo, e aos poucos, tudo aumentava de intensidade, inclusive a multidão que assistia ali, como se de repente fossem todos unidos em um só coração, parecia mesmo um corpo vivo, uma coisa só, simplesmente porque estava tudo em seu lugar...
Claro que a banda tinha toda a execução muito bem ensaiada e estava muito à vontade com a música em si, não só com a melodia mas também com a mensagem que ela passa, e isso faz toda a diferença. Mas principalmente, percebi que como cada um tinha a consciência de quem é dentro do grupo, ninguém precisou tentar aparecer mais do que o outro ou atropelar alguma coisa para que tudo fosse realmente excelente... e tudo foi, avaliando ao final, absolutamente impecável, mesmo sendo uma execução ao vivo de uma canção de louvor.
Bom, antes de prosseguir, um parêntese: eu não estou exatamente acostumada a viver de perto com igrejas realmente organizadas e que agem de modo profissional com a música, então para mim ainda é um pouco assustador perceber que, ao ouvir alguma música tocada por determinadas bandas (cujo nível é praticamente profissional, não necessariamente pela complexidade da canção, mas especialmente pela coerência no todo e com a precisão com que tudo é feito), e quando me deparo com algo do tipo, ainda fico impressionada que seja possível ver algo assim no meio denominado "gospel", já que muita coisa, mesmo as consideradas profissionais, são ao meu ver, às vezes soam estranhas (mas deixa pra lá porque isso é assunto pra outra conversa).
Dito isso, entendi que a música sempre me mostrou que a letra da música é importante, mas se for colocada de qualquer jeito, com qualquer voz, em qualquer intensidade, fora do momento e do ritmo certos, simplesmente se torna um incômodo, um problema, uma coisa a se eliminar, ao invés de ser uma excelente mensagem a ser passada a todos. Isso quer dizer que, por mais importante, impactante e relevante que seja o que sinto ou o que quero ou preciso dizer, se não for colocado do modo correto e no momento justo, o efeito será exatamente o oposto.
Ter a sabedoria de entender o momento é crucial: entrar fora da estrofe não ajuda, e atrasar o conjunto porque perdeu a entrada também não. Conhecer o volume da voz, de modo que seja possível ouvir a tudo, e a mensagem seja algo transmitido dentro do contexto, de modo que letra e melodia sejam uma coisa só harmoniosamente é primordial para que todos os elementos formem uma canção, e não uma agressão (e assim também o discurso, junto com o contexto, sem gritar e sem amolecer). Adotar as palavras certas para a letra, de modo que o texto se ajuste à melodia, faz com que tudo se encaixe perfeitamente, fazendo com que instintivamente o outro repita a canção, mesmo quando não quiser, porque ela não sairá da cabeça e a música "grude"... e isso é o mesmo que fazer a escolha certa das palavras para aquilo que se deve dizer ao outro, de modo que para ele faça tanto sentido, que não fique espaço para a dúvida (mesmo que o outro não concorde, o que pode realmente acontecer mais do que o esperado). Dar espaço para outros elementos é o que faz com que, no fim, a voz seja tão necessária em tantas canções: sem a letra, a mensagem fica comprometida, mas sem a melodia, a mensagem enfraquece, fica um pouco vazia, um pouco solitária, quase que como deslocada... e numa conversa com alguém, não parar para ouvir o outro, apenas disparar a falar e falar e falar e não permitir-se ouvir a outra parte, faz com que aquela conversa não seja algo produtivo para um relacionamento na esmagadora maioria das vezes, e sim apenas um desabafo, um despejo de ideias e sentimentos, sem apreço pela necessidade e opinião de quem escuta (ou talvez nem escute, já que percebe que também não está sendo ouvido).
O relacionamento perfeito, seja na música, seja na vida, pode até não existir, mas certamente, sabendo como lidar com o que precisa ser dito (e com o que não precisa ser dito necessariamente), e quando dizer, e como dizer, e com que voz... faz com que tudo seja mais suave, harmonioso, elegante e mais memorizado, como aquelas musiquinhas de campanha publicitária bem sucedida que quando você menos espera está na na sua mente, e em poucos segundos, desceu aos seus lábios e está saindo por meio de um tímido assobio, ou pelas primeiras palavras meio sem compromisso, quase como um acidente que, de repente, já aconteceu....

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