segunda-feira, 24 de junho de 2019

Wi-fi nosso de cada dia

Mudar nunca é fácil. Afinal de contas, ficar paradinho no mesmo canto é tão gostoso, tão cômodo, tão aconchegante... e mortal! Basta lembrar que água parada apodrece, e que tudo o que tem vida se movimenta, de um modo ou de outro. Mesmo as plantas, que não "se movimentam" como a gente está acostumado a pensar, tem sim um movimento de crescimento, e até uma movimentação pela sobrevivência.
Duvida? Faz então a experiência: pega um copinho de plástico, coloca um algodão molhado e um feijãozinho; deixa ele crescer por uns dias, e avalia para que lado ele vai crescer. A resposta é simples: ele vai crescer para onde estiver o sol, porque da reação ao sol vem a clorofila, que é a parte essencial para a sua alimentação, e portanto sobrevivência. E se você virar o potinho depois que o broto tiver crescido? Então, ele mesmo passa a se ajustar e mudar de posição sozinho, procurando sempre estar mais virado para o lado em que o sol está. Isso quer dizer que até as plantas, que são por definição "estáticas", tem seu movimento em busca do crescimento e da vida.
Prosseguindo com isso, viver então é mudar. Hoje eu vivo na França; até dez dias atrás eu vivia na Irlanda, e antes disso vivi na Italia por três anos, mas nasci e vivi mais de três décadas no Brasil. Tudo bem, eu não sou a regra, e muita gente nem muda de cidade durante uma vida inteira, quanto mais de país (e menos ainda de um país para o outro como eu), mas certamente todo mundo que está vivo (e neste caso eu excluo que está apenas respirando) se movimenta e muda de um jeito ou de outro. Mas... voltando ao começo, mudar não é fácil.
Eu por exemplo cheguei na Italia há três anos atrás com o meu número de telefone brasileiro e meu plano de celular tupiniquim (e não, essa expressão não é depreciativa, e eu não estou de modo algum reclamando do meu país de nascimento). Já nos primeiros dias, por uma questão de acessibilidade, comprei um chip italiano que mantenho até agora. Na Irlanda, eu usei esse mesmo plano de celular, mas mesmo ele me apresentando algumas limitações, eu estava em um local em que eu tinha acesso à internet sempre, seja em casa, seja por compartilhar de amigos. Ao chegar na França, eu simplesmente... me lasquei! Não tenho internet em casa, e o plano de celular que eu tenho fornece fora da Itália pouca conexão e muitas limitações, e com isso, eu tinha que escolher entre renovar um plano que se tornou ruim ou mudar de plano (e com isso encarar uma seleção de informações sobre planos de celular em francês, idioma que eu estou longe de dominar). Resultado: escolhi mudar!
Bom, mas porque escrever um texto inteiro sobre um plano de internet? Porque o que parecia ser um processo simples, na verdade, começou dias atrás e ainda não está concluído. E com esse alargamento do prazo, vieram situações que eu não imaginei ter que lidar (e confesso que me pegaram de surpresa e eu não sabia bem como lidar de início). Por exemplo: no dia antes de ficar sem internet, eu conversei com o meu namorado sobre isso, e ele disse que me ajudaria naquela noite a resolver. Chegou de noite e não conseguimos ver nada. No dia seguinte, eu estava de manhã, olhando para a janela e a primeira coisa que me passou pela cabeça foi que ele não priorizou a minha necessidade (escrevendo isso agora eu tenho vontade de rir de tão ridículo que soa, mas juro que foi a primeira coisa que eu pensei), e me senti abandonada (sem comentários!) porque afinal de contas, eu estava em um novo país sem internet. Fiquei nessa condição de coitadinha por cerca de uma hora, quando cheguei à conclusão de que ficar olhando pela janela me lamentando da falta da internet não ia me trazer internet, e nem me ajudar a fazer o que eu queria através da famigerada conexão que me faltava.
Então, algo dentro de mim aconteceu e eu fiz uma autoavaliação, e percebi que não nasci para ser princesa da torre, intocável e sem nenhuma iniciativa. Foi aí que comecei a pensar no que mais eu poderia resolver nesse momento sem internet, e foi quando eu lembrei que poderia ir a uma loja não muito perto de casa (cerca de uns três quilômetros) para ver umas peças para a bicicleta que vou começar a usar. Não ia resolver a minha internet mas, na verdade, me permitia usar o tempo de modo mais útil. Se eu sabia chegar lá? Não, mas eu tinha algumas indicações, então valia arriscar. Mais do que isso, se não desse certo, pelo menos eu teria conhecido um canto novo da cidade, e isso sempre me serviu de muita coisa em outras ocasiões na minha vida.
Decidido o destino, lá fui eu andando pela cidade. No começo, foi desconfortável, porque eu ainda brigava com os pensamentos de vitimização que tentavam me abraçar, mas aos poucos eu fui percebendo como era bom sair daquele "castelo" que eu me autoimpus e fui conhecendo um lado que eu não tinha parado para reparar (nem é tão bonito, mas eu vi coisas divertidas no percurso e andar me fez conhecer melhor o espaço que estou habitando), até que, de repente, eu cheguei na loja que eu queria. Entrei, e quando me dei conta, a loja tinha uma plaquinha sinalizando que ali tem wi-fi gratis... e assim eu tinha resolvido duas coisas ao mesmo tempo, e ainda conhecido um novo pedaço.
Passeei pela loja, mandei mensagem pra todo mundo (feliz e contente não só por poder me comunicar, mas porque eu tinha conseguido sair daquele abraço de amargura que a vitimização insistia em me dar) e adiantei o que precisava. Mas acima de tudo, entendi que mudar tem um preço, mas tem um prêmio também, e o prêmio é nos tornar uma versão melhor de nós mesmos.
A saga da internet, como mencionei, ainda não acabou, e nem os desafios que venho enfrentando, mas a cada um deles eu me sinto mais forte, mais realizada, mesmo que seja o mais simples deles. O que mais me alegra é ver que é sim possível não se render no que é pequeno, porque são essas pequenas coisas que nos fazem treinados para derrubar os grandes gigantes.

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